quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Ao Jayme

Certo dia você me disse que eu corria um grande perigo. Que eu era o tipo de pessoa que, bem no meio da guerra, por entre as balas se entrecruzando, poderia parar para pensar no porque do conflito. Alertou-me: nessa hora não reflita, lute.

Como eu queria uma de tuas metáforas pra me salvar agora... “Estás num ano Teflon”, na mesma ocasião, “nada cola”.

Sinto-me órfã de interpretar meus acontecimentos com mais esta lembrança. Sol, estrelas, planetas, em nada creio a não ser nas possibilidades que dão de elaborar histórias de me compreender. Verdades porque me cabem. Mentiras porque não se provam? Certas porque me consolam. Todas minhas.

Saudade de mim pela tua boca naquela mesa farta da tua linda sala. E depois do cafezinho íntimo feito o mapa do meu filho. Nestes dias escuros, precisava tanto daquela lua nova de me renascer!

A guerra está bem no meio, os tiros, as trocas, a mesquinhez humana a toda prova junto comigo e sem maquiagem. As palavras de depois da sessão: conceituais, autorais e para nossa apresentação - ainda estão na minha caixa de entrada. Meus poemas e teus textos de “homem interrompido” – segundo a tua fala.

Este escrito nem era pra ser este, mas o teu tamanho me dominou. Teu tamanho que me cobre agora por intuição de querer ser feito você: dos altos da economia, sair no meio da banda - criar o meu próprio bloco e juntar essa gente toda que eu venho conhecendo por obra do acaso.

Tua calda de cometa ainda vibra aqui: na praia do Leblon, num café do centro da cidade, no Moreira Sales, nas casas de quente fogão, no meu CD que traz de volta a tua voz doce e certeira – e que é agora a minha oração.

O fim do ano que chega, o tal balanço. A minha vida de 2009 daria um livro por dia. A minha solidão: essa imensa leitura. O nosso encontro: caminho de paz.

sábado, 21 de novembro de 2009

Para Bruno e Daniela




Daniela divina comédia
Daniela divina
Divide amor e multiplica
Entre amigos, família
E quem quer que venha
Daniela desenha um mundo no qual cabe alegria infinita
Um carinho que agita o coração de Bruno
Que uma hora resolveu crescer
E amar Daniela
Colorir na janela da sinceridade
Uma vida de verdade e devaneios
Uma vida de sonhos
Imagem de juntos viver
Crescer
Acolher a felicidade simples de ter casa
Filha bunduda
E Domingo no maracanã.
Bruno, que adora dançar, se ilude no tamanho das roupas que compra pra ela – tudo P:
P de perfeito
De preguiçosa
P de pô, eu já falei que eu te amo!
Bruno, repete
Não esquece de falar mais de mil vezes eu te amo hoje e sempre do jeito que és
P de amor primeiro, amor inteiro
Princesa minha
Biquíni que só eu posso ver.

XXA gente sempre procurou o amor
XXVencemos tempestades
XXTranspassamos as idades
XXPelo pilar da nossa amizade selada com verbo
XXEu SINTO:
XXAlegria, tristeza, barreiras
XXEu TENHO CERTEZA:
XXDe que sempre te amarei.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Poesia em Gullar

“Quando a morena vai embora a economia não resolve” - aprendi ontem com Ferreira Gullar logo após ter-lhe dito seus poemas, junto com o grupo de alunos da Escola Lucinda de Poesia Viva.

A poesia vai fundo na gente. O ser humano precisa disso. E mais:

O poema pode surgir de um sofrimento, mas no momento de escrever este sofrimento se transforma numa alegria estética.

A poesia nasce do espanto.

Na vida, o geral está explicado, o que não está explicado são as pequenas coisas.

Daí já vem as minhas divagações:

A poesia nasce dos nossos bastidores, e é pra lá que ela também vai. Surge nos hiatos de entendimento, nas sobreposições de pensamento e carrega, nas palavras, toda a força humana.

Ela não serve pra gente ter nada. Serve pra gente ser.

Também cumpre a função de extravasar de alegria e desenhar a nossa beleza. Une pela essência. Toca pela cadência.

A poesia é.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Grau de parentesco

“Hoje eu atingi o reino das imagens,
o reino da despalavra. “

Manoel de Barros

Naturalmente muitas pessoas me perguntam se eu sou parente do Carlos Vergara. Não bastasse a coincidência do sobrenome, somos masculino e feminino do mesmo significado. Carlos ou Carla: “um lavrador de terra que a transformou num jardim próprio para reis”.

Então ontem surgiu a oportunidade de estar presente na abertura de sua exposição, no MAM/Rio de Janeiro. Para lá segui com este propósito de me apresentar, saber sobre nossos antepassados e, portanto, me revelar.

Coração acelerou e a voz falhou diante do sorriso-olhar: “Carla Vergara! Nossa!” Prontamente me perguntou sobre a minha procedência familiar.

A família Vergara viera da Espanha e, chegando aqui, parte foi para o Sul e parte para o Norte do país, respectivamente as origens dele e minha. Se somos parentes, a distância é enorme... mas muito carinhoso, ele assinalou: “tem um primo teu aí, um Vergara que veio do Norte – o Guilherme. Fica perto que eu vou te mostrar.”

Meus pés doíam por uma bota precavida de chuva (que não chegou), e eu parti. Tal desconforto não combinava com aquela beleza disposta ao meu redor. Este Carlos, o não-primo do meu avô, é um sujeito criador. Faz coisas grandes não apenas pelo tamanho, mas pelo impacto que causam em nós.

Eu não entendo nada das artes plásticas e só bem recente me interessei pelo reino da “despalavra”, como diz Manoel. Mas ali não precisava saber. Só ver, sentir e ser.

Vou passear de novo naquele MAM, num dia de mais solidão, para estarem ali somente as obras e eu – neste silêncio profundo de criação que comunica Deus.

A terra dele é o ver
A minha, a escrever
O parentesco é esta engenhoca pregada na alma com a causa de transcender.

Guilherme, se ler esta prosa, adoraria te conhecer.

domingo, 25 de outubro de 2009

Criar-se

Mais um traço
Outro verso
Toda cor
Sempre o verbo
A vida verte sentido
E busca a força dentro de si.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Consumação

Botei anel de noivado
O fato se faz consumado
Lento, mas sem atrasos
Decisão pelo tempo passado
Sonhos em série
Frios no fundo da alma
Retiro a coragem do prazer dos pulos e das cordas bambas
Ando de sombrinha e de saia rodada
Pelo luar brilhante e apaixonado
Das noites sem fim
Dia claro se faz dentro de mim
Pelos erros e seus reparos
Pela vista que vai longe
Pelo simples que é ouvir meu coração e saber que o trajeto é certo
Da rede dos laços, quem poderá duvidar?
Da sede do novo, quem irá subtrair a minha língua?
Eu, que faço das flores espada
Desfruto da pequena conquista
Por singelo passo
Pelo caminho, que é vasto,
Sigo ereta
Repleta de dança
Sincera comigo
Comemoro por dentro
De cabeça descansada
O grande salto
Sono tranqüilo e pensamento fértil
Estou prestes a parir
Filho tão desejado
Parte minha amadurecida
Gerada sem licença e com certeza
Amada por mim.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Vem pra mim

Outro dia veio em casa uma amiga que está pra lá de envolvida com a terapia da Bioenergética. Contou sobre um exercício que não sei se terei condições de colocar em palavras, pois que seus olhos e mãos foram fundamentais para o efeito que se deu em mim: aos pares, simplesmente se dizia, uma pessoa a outra: vem, vem pra mim, olha pra mim.

Exercício de intimidade, de amor que se pede do profundo do carecer do outro para existir.

Amor menino e maduro: solicita sem malícia, reconhece em si a sua fragilidade e dela lança vôo ao mundo.

Passeiam no meu peito há dias aqueles olhos e mãos. Transpassam os meus tempos, a minha falta de memória colada no corpo e no meu ímpeto de sofrimento por vezes sem compreensão.

Um ser moderno eu sou: isso eu descobri ainda ontem pela sociologia contemporânea - o que não me deu conforto algum... Trocava tudo, até o enrolado dos meus cabelos, por um único instante de dependência plena combinado com acolhimento total.

Não é possível voltar ao útero...

...Talvez por isso eu adie (agora com um pouco mais de consciência) alguns dos meus importantes desenvolvimentos...

...Talvez por isso eu habite grandes indecisões, e sofra de uma incrível falta de praticidade para a vida útil...

...Talvez por isso um jeito passional de abordar a vida, recolhido de pulos mais abissais na hora da prova real...

...E talvez por isso eu esteja há dias me vendo ali, na fraqueza confortável daquele suplicar de palavras...

Foram os óbvios que atingi.

sábado, 19 de setembro de 2009

Pelo Mundo

" (...) Tenho em mim todos os sonhos do mundo"
Álvaro de Campos

Leva o meu samba contigo
O meu bamba
Um seu abrigo
Leva o meu texto no teu sorriso
A minha dança de criança
O meu sentido
Atravessa nos mares o meu ritmo
A minha molecagem
Esqueça a minha idade e fica com meu ventre que brinca.
Carrega contigo nosso umbigo de forró que encosta
O nosso giro
O justo grito de refrão que salta do coração.
Se te der alguma solidão
Tome este poema como um mimo
Um presente inesperado
Um dado de mãos
Um carinho no rosto
Um beijo inocente
O nosso jeito de ser gente na poesia
Como um gesto de transgressão.
Sinta, feito abraço
No laço de saudade
Como um encontro desejado
Um canto de conforto.
Se ti vires absorto de pensamentos
Com os fermentos das descobertas
Lembra da janela sempre aberta
Com teu espaço de voltar.
Pensa no Rio
No mergulho
Na maresia
No boteco Mineiro com o cheiro do feijão
No tempero de casa
No quente da batucada
Na poesia
Na cama feita
No amor perfeito e fraterno de irmãos
Sinta o azul, o céu, o mar
O verde, o vento, o ar
E a tua capacidade infinita de sonhar.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Aquilo que nunca se esquece


Na última segunda-feira, feriado muito ensolarado no Rio de Janeiro, me enchi de propósito e compromisso para que o meu filho aprendesse a andar de bicicleta. Ordenei que tirasse a camisa e iniciei com as principais instruções: manter o braço firme, o corpo sempre reto, pedalar bem forte e seguir olhando pra frente.

Foi então que me dei conta da quantidade de movimentos que precisamos equilibrar para que haja o tal deslize sobre as duas rodas.

Rajada de brisa no rosto. Rastro de liberdade. Pernas para a autonomia do caminho e do caminhar. Sobre isto irei aprender. Sobre isto irei ensinar.

Lembrança da minha infância marcada no centro de uma das pernas: certo dia carreguei uma amiga na garupa em “alta” velocidade, numa estrada de paralelepípedo. A idéia era voar com o impulso do quebra-mola. Ele veio e a gente foi: justo de joelhos no chão. Lavagem que ardeu na alma pra tirar toda aquela sujeira. Doeu, mas nunca mais desistimos.

Segurando por trás do banco, na parceria para a decolagem, tudo isso me ocorreu ao suor da ressaca de sambinha na noite passada.

“Você já está conseguindo!”, eu disse, e seu corpo se firmou para o desafio. O meu sonho se prestava para realidade, assim como as minhas mãos que fugiram do seu bumbum. De repente ele foi... juntou num passe de mágica: o firme, o sempre, o forte e a frente. Voou.

Rimos pelo meio no nosso medo, jogando a poeira para trás.

Na primeira reta sozinho deparou-se com um cão dormindo e o atropelou. Esqueci de ensinar a frear e que a vida anda, corre, pára e pode até voltar atrás. Surgi pra evitar a mordida, que eu também poderia cuidar.

V.I.T.Ó.R.I.A - foi isto que o seu olho sentiu naquele sorriso final: EU CONSEGUI!

Meu coração me cedeu este carinho eterno. Agradeci.

A primeira vez de andar de bicicleta do meu filho ainda teve um nome de batizado: Dia da Independência, em 07 de setembro de 2009.

Memória para eternidade: isto eu não esqueço jamais.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

O palhaço e a bailarina


Tenho na minha memória que meu avô era amigo do palhaço Carequinha. Não sei se a história procede. Fato é que, por muitos Domingos da minha infância, assisti Carequinha apresentar-se no Rincão Gaúcho, churrascaria que ficava de fronte a casa dele, na Zona Norte do Rio. Uni os dois, por fato real ou invenção, e me pergunto o sentido desta doce lembrança viva no meu coração.

O que recordo do meu avô é a sua dança espalhada na sala. Também suas roupas sempre brancas e perfumadas pelo sabonete Lux. O queijo coalho frito cheirando no café da manhã. A minha irmã mais nova, ainda bebê, subindo e descendo da sua enorme barriga, por conta da respiração.

Ocorre que a dança do meu avô, a despeito do seu peso farto por conta da comilança, era leve. Seu sapato branco flutuava, e eu, respirava no corpo duro que eu tinha.

Sim, o meu corpo era duro. Foi um corpo anteparo das angústias que eu desconhecia. Envolvia uma mente pisciana de sonhos, que transformava a matéria bruta da vida em matéria prima de arte. Uma mente que transgredia a realidade e inventava. Criou uma pedra pra ficar de pé.

Na adolescência, a dança me compreendeu. Aprendi, por inconsciência feliz, a dançar. Salsa, bolero, samba de gafieira e até o zouk, lambada importada da França. Sem nenhuma técnica ou qualquer aula, eu deslizava. De segunda a segunda, entre suor e sorrisos, eu só queria saber de dançar. Até hoje a dança representa uma condição de saúde, uma cura, uma realidade suprema. Uma música dançada, para mim, é Deus.

O palhaço, que delicado:
Freud e seu Édipo explica,
Jung e seu arquétipo explica,
O palhaço e a bailarina.

O palhaço descobre, desde sempre, a minha criança alegre dos Domingos do Carequinha. A minha menina que desejou aprender a dançar, e conseguiu.
Ele é o macho da poeta que a minha mulher é. De quem as sapatilhas são, hoje, as palavras.
E ainda traz meu avô por dentro, rodopiando entre as nuvens do céu.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Expectativa

“Eu amo a minha escola!”
Ele exclamava bem em frente ao portão
Depois da esticada das férias
(por coisa esquisita na população)
Era o dia do reencontro
Da retomada do quintal da sua vida de aprender a ser cidadão
Manhã seguinte de parque
De árvore
De amigos
De muito beijo de mãe - por vezes sonho ter estoque de selar e não é que acontece!
Esse jeito pele de amar
Jeito meu
Deixa nele uma marca
Um excesso.
Tenho dias de transbordar
Um moinho no coração:
Pôr do sol, paisagem de mar,
Vôo rasante e de alto de céu
Língua que toca bem na boca do meu estômago, do friozinho que dá
Horas de abraçar...
Pensamentos de sexo que prefiro nem relatar!
E uma madrugada inteira gestacionando palavras
Até que às 5 da manhã
Na beira de dormir
Ocorre o parto
Na lembrança do que outro dia ouvi:
“Vocês mulheres inventam essas historinhas e nos põe de personagem, sem nem nos avisar!
Caraminholas, camisolas, calcinhas, champagne, viagens, banhos quentes, declarações
Ora, tem coisas que nem precisam presságio...
Além do mais,
O que seria dos poemas?
Qual seria a função da minha imaginação se não fosse essa de fabricar as minhas coisas de imaginar?
Eu vivo:
Mãe, não só - também mulher de amar
Numa seqüência circular e sem fim.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Carne minha

Corpo desnudo, tenho por meio das palavras.
Medos esparsos
Sangue inexato
Cantos pungentes de conversa.
O sentido do meu existir, permuto com memórias marcadas
Que no ventre da cama
Dão sinais.
Acordo feia
Vasculho nas veias a direção
Coração esquisito... ainda bem...
Sabe que a vida é dor e por isso ri.
Aprendo do percurso na condição -
malemolência
Preguiça
Conhecer é lento e não quero ter pressa
Quando excedo
Acontece uma placa bem grande na minha testa.
Ainda estou nos extremos de pensamento variado e ação repetitiva.
Assim como concebo nas palavras
É no corpo que preciso criar a minha poesia.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Exemplo

Eles corriam curiosos pela floresta
Buscavam bichos, pedaços de pau, frutas
Molhavam as mãos na água
E correndo atrás de borboletas
Colhiam asas para sua imaginação.
Eram dois corpos perfeitos
Livres a percorrer espaços
Que no entrelaço da amizade
Apreendiam, por condição de viabilidade,
Sobre o laço a um irmão.
Assim sou mãe do espaço
Da vista
Da paisagem
Da cola secreta que une um ser ao outro
Do acaso da vida
Da intenção de amor.
Pouca idade, já não tenho mais...
Partes doem
Sofro de insônia
A pele desbotada na varredura das manchas
E um sangue, que de vermelho que é,
Me empurra por dentro, inquieta.
Há tempos desconheço o manso
Oro cada vez mais por um verbo infantil:
Quero, brinco, sonho, descanso
Carinho, choro sincero, sentimento limpo
Mãe, deita aqui até eu dormir?
Desejo andar de mãos dadas
Irmãmente assim
Como aquela liberdade de dois seres
Desfrutando dos saberes da alma no concreto:
Chão – passo
Desejo – beijo
Espanto – abraço
Molhado – esparramado pela pele toda
Percorrendo o trajeto de reconhecimento:
Assim eu sou, sinto, vejo, almejo – e faço.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Gente é gente - e é importante

Gente ama
Gente sofre
Gente chora
Gente ri
Tem medo
Tem coragem
Tem bravura
Pra construir
Gente deseja
Almeja
Peleja
Enfraquece
Gente sonha
Corre atrás
Se ferra
E depois esquece.
Fica triste e fica alegre
No espaço de um instante
Perde o jogo
Se machuca
Se levanta
E segue adiante
Atenção para um dito
Que é muito relevante:
GENTE É GENTE.
Não é ferramenta
Não é recurso
Não é processo
Não é método.
Gente é gente
E é importante.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Amém

Me disseram os astros que até Outubro seguirei com as minhas perdas. Assim se deu com a minha identidade, o meu emprego, um grande amigo e mais recentemente, um tanto da minha liberdade. Não creio em destino ou coisas pré-determinadas, mas talvez, por assim saber das minhas probabilidades, como que encaixo os fatos no leito da minha compreensão. Plutão, mestre dirigente da minha transformação e com quem venho ganhando intimidade, tornou-se par para um meu diálogo de aprender o que nesta vida vale. Tudo sem desespero, mas com a tristeza necessária. Com firmeza, o meu saber se faz sozinho e calmo em cada milímetro de coração que aperta. Estou certa do pensamento e curva do caminho . Vasculho montanhas, passagens, passado. Vislumbro paisagens de mar. Não tenho certeza de nada. Das minhas entranhas brotam as palavras e os significados. Dói rasgando, mas liberta coisa que eu não perco jamais. Não há bandido que leve as minhas artimanhas, então ando agradecendo por tudo, mesmo que pareça incrível. Ouço de próximos: “Nossa, que maré!” e eu sigo remando, colecionando formas de me defender e de brilhar. Vai dar pé!

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Abram alas

“Ó pai, duro é este discurso, quem poderá entendê-lo?”
Adélia Prado

“Sei que fazer o inconexo aclara as loucuras. Sou formado em desencontros.”
Manuel de Barros


Adélia me dá liberdade quando nada mais me cabe
Função de poeta é acolher contrários - disse Manuel do simples de sua clareza.
Não fosse a poesia
Me sentiria apenas esquisita ou fora de ordem
Voluptuosa e sem controle nenhum dos sentidos
Do meu sabido de viver.
Olho pro meu umbigo
Vontade de me abrigar numa função qualquer
Numa palavra qualquer
Numa commoditie reconhecida pela sociedade já que, em mim mesma, não encontro um passo reto.
Horas vendo o nada
Filmes me trazendo a soltura
A literatura como a única fala possível
Porque a vida está grande demais.
A água me ofertando uma querência mole
Lenta
Sonolenta
Que não condiz com uma mulher de trinta e três anos
Que sempre se deu a missão de lutar.
Não faltam exemplos
Estímulos
Conversa
Promessa de que tudo vai mudar.
Estática, desejo por egoísmo:
Se eu pudesse deixaria o mundo parado
Para ver a minha tristeza passar.

“Mas alguma coisa acontece no quando agora em mim. Cantando eu mando a tristeza embora.”
Caetano Veloso

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Uma tarde no Petit (Paulette)


Conhecemos a Renata, que nos serve uma gelada após a outra entre deliciosas comidinhas e é casada com o cozinheiro. Renata tem um par de filhos, um de dois e outro de doze - o mais velho toma conta do menor enquanto ela atende ali - bendito feitio do tempo que me acolhe em conversa e por dentro abraça os irmãos pra labuta materna.

Ficamos as duas nos versos de amor e sentidos de ventre, que aos cochichos sabemos. Palavras fogo de não queimar, palavras sopro de acalmar leite-sentimentos.

Do inesperado surge o caldo, a cultura, o futuro. Vejo por onde crescer e tanto medo! Da alma de boteco vem o anjo, o servo das possibilidades de encontros sem precisão de resultado mas jorrando água na direção do meu vento: impossível voltar atrás.

Minha calma é um corpo lento que deseja as ondas de mar e me leva pra lugar certo. Eu sei e aceito como que em conjectura de astros, quase irracional. Conheci meu dono tarde (o poema), e depois de sua invasão toda a vida retomou seu sentido: musica, filmes, bares, a minha profissão, os homens diante de mim e mais ainda o meu umbigo.

Nós duas, mulheres e mães extremamente nesta ordem, vivemos uma tarde de malemolência conversatória, da qual nosso íntimo mestre, de longe participou por nossa união. Sorrimos como fotos de jornais, achamos nossos entre-universos pedindo mais: amor, amizade e poesia - numa boa mesa de calçada.

A Dê e eu.
Depois o Zé.
Com Paulinho, no Petit.

A cria queria cheiro e esta metade venceu. Segui em paz.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Inspiração de amar

“Estamos encontrando a nossa forma de viver juntos”, ele me contou. E eu pensei: isto é estar disponível para o amor e aprende-lo de forma natural. O amor é um grande encontro de essências. Aprendi certo naquele dia - e simples, como deve ser. Apenas uma frase, algumas palavras bem dispostas e meus módulos mudaram de lugar. Desejo de amar animou meu corpo, me respirou fundo. Uma calma enorme por ter sabido do amor assim, em feitura amorosa desamarrada das coisas expostas. Existem mais como eles? Como eu? Naquele dia, por fato real e conta de probablidade, concluí que sim. Havíamos nós nos encontrado, dentre tantas milhares de pessoas que vieram de Belém para o Rio trazendo o seu amor na bagagem. Então, enquanto não chega às minhas mãos a massa, a tinta, a matéria nua: fico a espreita em silêncio de poesia, percorrendo cada canto meu que corre sangue e se arrepia de vontade de viver.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Bailarina

Na barra da saia dela
Mora uma bailarina
Que atiça esta menina
Com o fogo de mulher

Quando ela entra na roda
Todos clamam seu rodar
Ela desce até o chão
Coração a disparar

Roda, roda bailarina
Chama o povo, contagia
Vai levando alegria
Que é o que todo mundo quer

Roda, roda bailarina
Traz à tona a criança
Tua volta é toda dança
Tua sina está no pé.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Neste dia

Quando
De mais a mais
O amor houver
Vale a pena subir mais alto
Mais rente
Mais forte

Quando
De mais a mais
Mais simples for
Estou lá
Confusa e plena
Na sorte dos animais

Não tenho norte
Destino
Promessa
Só tenho a reza
Dos ancestrais

A fonte da vida,
Árvore rara que se cultiva interna e se expressa no corpo,
É divina humana comédia
Teia de sentimentos
Poema bêbado de sambistas
Que se toca até de manhã

Já tonta nem sei o que digo
Só ouço vozes do coração.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Para a vida toda

A poesia sempre foi nossa companheira
Nosso elo
Nossa amiga
Com você inaugurei esse reinado em mim
Transcrevi tudo que fui sentindo
As tuas provocações que me percorreram
Relatei passo a passo do que foi me acontecendo.
Alguns medos preferi não escrever...
Optei por escondê-los até de mim mesma
E também de você
Mas a minha coragem
Esta sim ganhou imagem nas cifras
Esta sim se desenhou.
E agora
Que você foi embora
E se restringe a algumas mensagens de saudade
Alguns almoços e fins de tarde no meu pensamento
Ela é ainda a minha companheira
É por onde falo o que quero sem sequer precisar te dizer
E conto para mim mesma o que foi te conhecer
Me apaixonar por você
O que é te esquecer...
E ler de forma distante quando você se remete para mim.
Os laços que me uniam a ti se afrouxam
Perdem-se no tempo que você nos dá
Deixam-me ausente da tua presença
Mas muito íntima da minha própria pessoa
Dentro do meu corpo, a nossa lembrança voa...
E se registra
Quase todo o dia
Na amizade que eu fiz com a poesia.

domingo, 28 de junho de 2009

Peguei fogo num Domingo

Domingo, sete horas da manhã. Acordo, com aquele ar preguiça totalmente impregnado no meu ser. Rolo várias vezes até ter coragem de levantar da minha grande cama king size. Domingo é um dia que prezo pela farta mesa de café da manhã tão ausente nos dias de semana em que tenho que correr para levar meu filho para a escola e chegar no trabalho as nove horas.

Enquanto tiro da geladeira leite, manteiga, frios e frutas, escuto meu filho chamar: “Mimi, onde você está?”. Não sei porque-cargas d’água de sábado para cá ele passou a me chamar de Mimi. Respondo: “Na cozinha, meu amor”, e ele vem correndo para me ajudar a aprontar a mesa para quando o pai acordar.

A esta altura imagino que você está se perguntando: porque será que o nome desta crônica é “Peguei fogo num Domingo”. Calma... eu já vou explicar. A história começa quando peguei um pão francês que estava congelado para esquentar. Abri a porta do forno, coloquei o pão, virei o gás e apertei o botão para acender a chama. Poucos minutos depois, percebi que o forno não esquentara. Abri a porta novamente e sem pensar e, péééééé! Apertei o botão. Não preciso dizer que vroou... a chama explodiu em cima de mim! No susto, saí correndo pela casa gritando: “Tô pegando fogo! Tô pegando fogo!”.

Meu marido que dormia acordou de repente e pensou “Oba!”. Veio correndo ao meu encontro crente que ia começar o Domingo com um momento ardente de sexo e amor! Que decepção ao me ver adentrando o corredor com parte do cabelo queimando... Gritos, fumaça e o meu filho chorando de susto, foi tudo que ele encontrou! “Calma, meu amor!”, era tudo que ele dizia repetidas vezes enquanto as cinzas capilares caiam pelo chão. “Meu nome é desespero!” O que fazer com o meu tão cuidado cabelo, cliente de escovas progressivas mensais, hidratações com Kerastase, Lanza, Redken e tudo de mais caro que se possa imaginar?!

Conformada, segui para o banho, tentando identificar o que restara de mim. Sim, porque certamente meu cabelo e eu são praticamente a mesma pessoa! E enquanto a água caía, me via adentrar pelo ralo pouco a pouco, sem saber onde ia parar. Depois, vivi momentos de tensão até que o cabelo secasse e eu visse refletido no espelho meu estado final.

Graças a Deus que minha cabeleira é farta, e só quando eu mostro e conto para as pessoas é que é possível ver o estrago feito pelo fogo. Um pequeno arco natural em cima do rosto é o estilo que terei que assumir pelo período estimado de 3 meses, até que se forme um chumaço para cobrir o buraco do cabelo queimado. Posso dizer que sobrevivi.

Escrito em 2007

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Expulso de casa

Chega!
Saia já do meu poema!
Descontamina o meu sentimento com seu tema
Pois estou cheia de viver no papel.
Já que você não vai promover ato
Vai ficar aí, me lendo
Gozar te vendo desenhado na escrita, some daqui!
Abra agora espaço para outro macho existir
Nem que eu tenha que fazer despacho, canção, reza ou oração, você vai sumir.
Ora bolas! Que intenção é essa de me ver sucumbir sem me fazer praticar o amor
Sem me deixar desfrutar do prazer de ti
Esfregar-se em mim
Olharmo-nos em meio a multidões
E sonhar com inesperados amanhãs?
Se você já martelou a sentença dos dias que virão
Para que continuar objeto do meu texto-canção
Com este tom de casamento de alma
De saudade do não vivido
De encontro partido?
Se você não quer ser meu homem
Escolheu não ser cor no meu quarto
Flor no meu caminho
Sai do meu ninho
Desabita meu coração
Arranca esta esperança do meu peito!
Eu vou chorar, chorar, chorar muito
Mas essa água há de lavar minha decepção
Deixar novinha em folha a minha poesia
Novos personagens ajudarão traduzir em versos o meu conteúdo.
Jamais serei apatia
Nunca me faltará tesão
Agora, quanto a você, eu não sei não!

Menina das águas

Menina das coisas misturadas:
As de dentro e as de fora.
Quando choro,
Choro destes sem palavras,
Só o colo das águas me consola.

sábado, 20 de junho de 2009

Releitura

Novidade: ele agora gosta de livros sem ilustração
Porque sua imaginação
Produz imagens a partir minha fala
"- Mãe, eu tô prestando atenção, só que não preciso mais ficar olhando pro livro enquanto você conta essa história: as figuras se formam na minha cabeça"
E aprendo com precisão
que o meu tempo de amar e educar
e educar e amar
Ler sem ver o tempo passar nas noites sem fim
pele a pele na cama
são as eternidades que juntos produzimos.
Não tem preço
Não há palavras
Saber que do meu ventre nascido
E apenas seis anos após este fato
Meu filho é retrato da criatividade nossa.
Na sala, a estante lotada
Nos quartos
Pequenos pedaços da nossa memória coletiva:
minha, dele e de toda a humanidade.
Que seja esta a nossa verdade íntima
A nossa união
O nosso ritmo
A renovação permanente do meu umbigo
Da sua amamentação
E o sentimento do seu lugar cativo
No meu coração.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Em burilação

Temo, talvez, pela minha imensidão. Por isso é lento o modo como me organizo. Neste indo sem tempo navego sem leme, sem pressa e só. Revelar-me é tarefa árdua, é garimpagem. Sobre a minha bruta realidade, labuto na lavra até enxergar a essência, que há de ser farta. Tenho esperança, tenho energia, mas por vezes me falta anteparo: dá preguiça e disperso - pois é duro ser difícil me achar. Não estou pronta, eu penso. Há em mim o que preciso? Eu não sei. Nunca soube de coisas a não ser sentimento (que, ao final, não enche barriga) então, simplesmente digo: estou com medo de ter ainda mais coragem, estou na corda bamba. Esqueci do "até então"? Porque quero e não desejo mais lembrar. Escrevo do interno e do futuro e gosto tanto do processo que evito seu fim. Preciso de contenção, de gente me apontando o caminho e me levando pela mão, sem me tirar do ar. Estou sem fôlego e feliz: é bom estar investida e despir-me assim, devagar.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Decifro-me e me devoras

Templo de palavras e afetos
Fantasias e trajetos intermináveis
Meu abraço é casa de amigos
E meu beijo selo-sentimento
Dos amores que eu vivo.
Habito um corpo-desejo
Um corpo-esconderijo
De decididos prazeres.
Sonho alto e nunca reto
Certo, sereno, distante
E sempre adiante.
Amo a mais e desperdiço
Não há vergonha, pudores
Ou mitos pré-concebidos
Sou pessoa de múltiplos sentidos
Íntimos carinhos
Ritmos intensos
Passeio por dentro do que se abre
Do que se mostra
Do que se vê
Percorro exóticos lugares
Numa lógica de crer
Que no mais esquisito escuro
Pode nascer uma flor.
Perco-me em vontades, imagens, projeções
De futuros amanhãs tomados por paixões
Lindas, leves e minhas.
Alterno: fatos e versões
Planejo e intuo em desmedidas proporções
E crio, confundo, inundo a minha alma com palavras-rios de me navegar.
Eu nunca irei me alcançar...
Haverá tarefa pra vida intera:
Aprender a me decifrar,
Pro amor me devorar.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Manhã seguinte

Eu sabia que seria assim
Eu sabia que a minha luz do dia se faria no meio da tua noite sem fim
Que as nossas palavras eram ponte para beijos
Que as nossas línguas nos levariam aos nossos universos
Aos nossos reversos
Aos nossos particulares.
Eu via o flerte da minha poesia com o teu texto
O contexto que ela se metia sem vergonha
Eu sabia que a minha idade diminuiria diante da tua macheza
Brincaria com a tua razão
Que eu viraria água diante da tua dureza
Da beleza das tuas posições
Do teu mastro me guiando.
E assim vou me acordando
Transmutando as minhas opiniões
Abrindo clarões em mim mesma
Onde posso ver-te de outro jeito
Interno
Inteiro
Sabendo muito bem do teu lado bom
Da tua magia diante da minha fotografia perfeita
Diante do nosso enquadramento.
Não existe coisa certa
Ou coisa direita
Existe a verdade de um sentimento
Por onde ele nos guiou.
As opções que faremos agora,
Que a quantidade das variáveis aumentou,
A gente não tem como saber...
Não nessa manhã seguinte ainda noite de ontem
Neste eu e você que as 24 horas complementa
Que o teu Manu Chao embala
O meu Lenine relembra
No meu discurso ainda meio ressaca.
Entre eu e você ainda tem o tudo e o nada
Depende por onde a gente se movimenta
A história que se passou já é nossa
Daqui pra frente, a gente inventa.

domingo, 7 de junho de 2009

Poema de casamento

Amo o amor que faz
Fernanda amar Renato
E Renato amar Fernanda
Amor de brisa de praia
De fogo quente e de ventre
Amor de vela e de varanda
Amor – semente.
Amor - Clarice a dentro
Amor fervendo
Amor comendo
Amor em simetria perfeita: corpo, alma e pensamento.
Amor -fêmea: que acolhe, recebe e perdoa
Amor-macho: que luta, que caça e que doa
Amor de família longe
Amor de família perto: domingo de voley e bagunça:
-Fernanda, por que você não foi nessa bola!
Ah... Fernanda... me namora
Me enrosca
Me beija e me dá um filho
- Oh, Renato, não enche!
Se aconchegue
Me esquente
Sim, eu grávida de um filho nosso
E aceito viver contigo pra sempre.
Amo amar o amor desses dois
De promessas de depois
De verdades
Amor de sentimento
De viver lindo, cada momento
Amor de casamento.

Poema especialmente escrito para o casamento de Renato e Fernanda.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Incansável

Procuro palavras quentes pro meu coração esquisito
Que até ontem eu pensei saber,
que nada.
Se eu já confiasse nas cores em mim ventadas
Nos frios que me sobem a espinha
E dão nozinhos no peito,
Mas nem...
Eu fico armadilhada
No centro de encruzilhada
E volto três casas pra trás!
Vida em jogo
Ritmo louco
Sentido de vai e vem
E um aprendizado de me fazer cada dia um tanto mais minha.
Sangro de passar no pensamento de viver quem sou: fêmea
Choro de viver um sentimento que não tem amor
E nem um rastro de delicadeza.
Que se afastem de mim os textos de alma pequena
Os olhares sem olhar
E tudo que não for beleza.
Em instantes me recolho
Me acolho no meu quentinho de versos
Meu universo de gente amada
E não me ofendo:
Pela primeira vez não misturada
Me afasto de criança mimada
Com sabedoria conquistada
Às custas de muito perdão.
Agora, com minha vida nas mãos
(Mesmo sem saber por completo o meu coração)
Os meus atos são mais sãos
E abençôo cada decisão tomada.
Planto flores na minha estrada
Canto na caminhada
E mesmo sozinha, me sinto feliz!
Toda renovada e aprendiz
Respiro fundo a vida que há por vir
Então avanço
E não canso
De acreditar no amor.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Luxúria

Ando comprando sem perguntar preço
Só pela gostura de me ver de enfeite
Dizem que é problema de vaidade
Eu sei que pode até virar vício
E nem abro a conta do cartão para conferir a profundidade.
Ainda hoje conheci quase todo Manuel de Barros
Quase o nada
Assisti Woody Allen e entendi coisa que só se entende por compreensão inconsciente
A modo de terapia.
Às vezes me encontro com a culpa e ela queima
Daí jogo água
Dou uma trégua para esperar no que vai dar
Deixo tudo acontecer pra depois me perdoar
É pecado de Luxúria...
Mas o vestido tinha estrelas num espaço sideral
E eu queria mesmo era voar.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Movimento novo

Eu estava prestes a entrar no banho
Quando ele adentrou para contar a novidade
Interrompeu-me para mostrar o movimento recentemente aprendido
O gira-volta de corpo subitamente sentido
Como descoberta fenomenal.
Olhou-me nos olhos e fez a “estrela”
Que brilhava mais do que qualquer outra no céu.
Filho, você é minha constelação
Ilumina cada passo que eu dou
Desvenda-me em maternidade.
Com sua pouca idade
Foi quem até hoje
Mais me ensinou
Tudo que sou se acelerou com a tua chegada
E renasce a cada estréia tua.
Sinto-me nua
Despida de defesas
Em meio a correnteza deste amor incondicional.
Em qualquer tempo-espaço-sideral
A cena do teu palco
Será sempre a principal.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Cores em mim

"Eu ando pelo mundo prestando atenção
em cores que eu não sei o nome
Cores de Almadóvar
Cores de Frida Kahlo, Cores"
Esquadros, Adriana Calcanhoto

Eu gosto muito de me ver colorida!
Ponho roupa de uma cor e meu corpo todo vibra no seu tom.
Escolho a cor de acordo com o humor que quero me dar de presente naquele dia
E sei quais delas que me caem bem.
A luz de uma cor provoca um certo reflexo nas pessoas
De modo que não posso usar amarelo se quero ficar reclusa
Não posso usar marrom de quero reluzir
E abuso do rosa se estou em dias para amar.
Se quero atiçar, lanço mão do vermelho e combino com assessórios dourados: é fatal.
Quando estou nublado por dentro é cinza minha vestimenta,
E há uma certa malandragem no verde
Porque “despretensiosamente” combina com meus olhos
Realçando a felinidade do seu contorno.
As cores ditam os tons dos meus discursos do dia
Dos meus encontros da noite...
Por isso as des-uso até na lingerie.
Sou arco-íris na personalidade
Todas as corem me intervém
Me vestem por dentro e por fora.
Cada cor que eu uso
Também me namora.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Poesia e vento

A palavra venta
E a escrita se apruma
Me convidando pra velejar.

Eu, na minha forma de mulher vento
De mulher nuvem
De mulher mar
Toda envolta em seios
E beijos de amar
Me solto na dança das ondas
E das pernas de enroscar.

Líquidos-língua
Pele que encosta
Tempo que ensina um corpo caminho, e eu aprendo:
Registro ventanias
Brisas no rosto
Noites de luar e lençóis
Com banho quentinho bem de manhã.

Eu quase não quero acordar
Mas a palavra chega
Nem pede licença
Me seduz e me traz um poema...

Luz no meu coração
Não tenho como negar
Ao sono, peço perdão
Palavra vai ventar.

Centro de Tradições Nordestinas

Este sábado fui à “Feira dos Paraíbas”, em São Cristóvão. O local passou por uma reforma há cerca de dois anos e agora se chama “Centro de Tradições Nordestinas”. Um grande pavilhão, composto de pequenas lojinhas, uma ao lado da outra, para todas as direções. Entre as fileiras, pessoas se aglomeram ao redor de duplas de repentistas, restaurantes típicos e um palco central.

Ao redor vê-se rapadura, queijo coalho, tapioca, cachaça e toda sorte de comestíveis. As carnes de sol penduradas, tais como roupas no varal, causam uma sensação de que não apenas estão ali os artigos, mas também as tradições na forma como o produto é comercializado. CDs e DVDs parecem pular de gôndolas e prateleiras, gritando – está aqui o verdadeiro coração do norte-nordeste! As músicas tocam confusas, todas ao mesmo tempo, mas ninguém parece se incomodar. Além de comer e ouvir, pode-se também vestir blusinhas, vestidos e decorar a casa com todo tamanho de toalhas de renda branca, colorida ou bordada.

No largo corredor que leva ao palco principal, restaurantes decorados estão dispostos em seqüência. As churrasqueiras elétricas ficam à vista, exalando o cheiro da carne queimando. Os garçons nos abordam entregando panfletos e falando das virtudes da casa, tentando conquistar o freguês. Após olhar alguns deles, intuitivamente sentei, pedi o cardápio e uma cerveja.

Ali fiquei, jogando conversa fora, num clima bem descontraído. Lá pelas tantas, vejo o garçom que me serve no trabalho sentado numa mesa próxima. Fui ao seu encontro e o cumprimentei, sem perder de vista meu filho que saía correndo atrás de um vendedor de brinquedos de plástico. Todo orgulhoso, ele me apresentou a mulher e a filha. Após trocarmos algumas palavras e sorrisos, fui retornando, pensando com meus botões – que bom tê-lo encontrado por aqui!

Depois de comer a típica carne de sol com macaxeira, queijo coalho frito, dirigi-me à atração que reunia nordestinos, nortistas, cariocas e alguns turistas. A banda de ritmo “Brega”, tal como se classifica o estilo musical que tocava, fazia com que muitos dançassem. Alguns se entreolhavam e sentiam-se constrangidos com as letras recheadas de vocabulário de ”baixo calão” e com a coreografia dos bailarinos repletas de movimentos um tanto sensuais.

O fato é que os verdadeiros anfitriões pouco se importavam com os diferentes olhares sobre a sua verdade. Com sorrisos largos, espalhavam-se em movimentos e revelavam através do olhar o conforto do retorno à casa. Os mais desavisados poderiam ver ali a música “brega”, a dança “vulgar” ou a palavra “chula”. Outros mais atentos viam a alegria de um povo que, mesmo longe de casa, luta para manter suas tradições e orgulha-se de sua origem.

Ficava tarde, criança com sono, hora de ir. Olhei ao redor e me despedi. Fui para casa refletindo: o quanto a vida é diversa e rica para aqueles que sabem a ela se entregar; o quanto é importante estar aberto ao novo, ao diferente, ao inusitado; o quanto é prazeroso experimentar o mundo livre de preconceitos; o quanto nos falam os olhares, os movimentos do corpo e as manifestações de um povo. Foi um instante intenso de alegria e prazer.

Escrito em - 03/04/2006

domingo, 17 de maio de 2009

Desobediente

SEXO MUDA TUDO!
Foi nesta constatação, comigo mesma,
Após tantas divagações sobre o tema
Tantas conversas com intenções
Que eu cheguei neste sábado à noite

Mais uma vez sozinha
A rolar sobre a cama com a cabeça colada nele
A pulsar sobre a cama por causa dele.
O rapaz de olhos-gato
Por quem mil poemas tenho criado
Por quem tenho me interessado sem nenhuma temperança.
- O rapaz é comprometido, zifia... Já repeti para a minha cabocla mais de um milhão de vezes!
Mas a minha brincadeira não cessa
Já que o objetivo confessa que não muda por estatuto
Assim minha água transborda sem que eu possa conter
E eu volto a dizer
No intento de me convencer:
- SEXO MUDA TUDO! Repara o caminho que cê ta fazendo... tá se metendo em melê!
Avisos em vão...
Meu coração não escuta
Transforma “não” em “por que não?”
Almoço em encontro
E-mail em carta de amor
Qualquer sinal dele em vontade louca de me ver
E me despe de todo pudor de pensamento.
Tormento de moça solteira
Sorrateira ao interpelar-se no outro
Ao entrar com o mínimo de fresta
Nesta porta supostamente fechada
Mas de fato aberta.
Essa vontade de sexo...
Essa usura pela carne que por séculos e séculos falsamente se privaram as mulheres
Essa puta minha que não se aquieta
Não se conforma com a esfera espiritual da existência e desce no inferno
Na humanidade animal.
Ignorei todos os alertas de:
“O SEXO MUDA TUDO”
Eu quero mais é que mude
Entrei
E desobediente que sou:
Eu dei!

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Para Jeri

Na terra do paraíso
Toda hora é hora de paraisar
De dia, de noite e a pé
Com bicho geográfico e menino
Correndo na beira do lago
No rastro do vento.
Terra de leme e de sol
De anzol e de vela
De café na janela
Risoto e vinho
E forrozinho até de manhã!
Fonte de amigos e cantoria
Jeri tem Bob Marley por Larissa
até por onde a duna curvar de não ser mais morro
No beijo da areia com o mar.
Jeri tem pedra furada
Peito encontrado
Tatajuba e caranguejo
Mangue seco e desejo
De mais uma gelada.
Capoeira de praia
Poeira da noite
Kalango em ponta de pedra
Lual pro amor embalar
Caminhada na estrada do azul
De sempre e mais voltar.

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Risoto-poema-etílico

Chama-se risoto-poema-etílico
Quando o gosto e o efeito vem de dentro
Do poema que se come,
Que se bebe
E se brinda.
Se o verbo é ingrediente
Que derrete a palavra
Que se engole
É à alma que alimenta.
Então digere
E evapora.
Sai voando pensamento
Casam: fato e elemento,
Peixe com gaivota,
Palhaço e bailarina.
Casa o homem com seu sonho,
Casa o nosso coração.
No altar da meia-noite
Duas mulheres
Aromam o escuro do mundo.
Desfazendo amarguras
Com cheiro de versos
Comungam com o universo
de lápis e colher na mão.


Poema meu e da Jac

Um rei ventou dentro de mim

Menino do vento
Me soprou histórias de ser quem é
Velha alma amiga
Te levo comigo toda vez que respirar
Te carrego no olhar por onde se conhece tudo -
O mistério que não é mistério, de simples que é:
O homem no seu lugar
A mulher descendo do altar
E um encontro no começo de amar.
Viva a vida!
E nós que a deixamos entrar
Pedindo licença em língua, pele e palavra
Viva voar sem asas
E viver as brasas das noites e das manhãs.
Menino de ar...
Corre pelo mundo
E se um dia precisar de abrigo
Tem a paz que você me deu.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Menina-Anjo (Para Jac, um anjo no Divã)

Era uma menina que seduzia a infância e se agigantava
Só para não caber em si
Uma menina-anjo que extrapolava
E amadurecia em cada parto:
Tinha dor, tinha prazer
E um Deus que transformava.
De repente havia a mágica-palavra-expressão
Para mostrar ao mundo que a imensidão a habitava,
Urgia,
Nascia,
E se registrava.
A menina virava profeta
E no divã do mundo
Ela curava.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Intimidade

Entra aqui, dizia-me ele
Passeia pelo meu caminho com bombas e tempestades
E eu contando uma história de início, meio e encruzilhada
Doida pra tirar o disfarce.
O meu papel é de autora, eu pensava
Escolhia as palavras
Quando o que eu queria era abraçar
Tem coisas que só o silencio
Ou a poesia repentista que recebi
Mais uma vez que eu vi a magia detrás capa e me apaixonei.

Acordei com Manuel de Barros
Brincando com gravetos, formigas e peões
Vi um conto de fadas de um menino, um rei e ilusões
Com uma princesa para salvar o amor.
Corri pra me confessar
Versos, por favor, me acolham!
(Porque esta é a função do padre, e não a de julgar)
E me absolvi.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Alguma loucura

No outro há sempre algum espanto. É quando se pensa que com toda delicadeza seja possível contornar os seus gestos nas paixões alegres de Spinoza (é o meu egoísmo). Até que surge uma verdade sem maquiagem e na forma ereta a penetrar a tal imagem que se fez.

Há uma sabedoria profunda em aceitar o humano nu e tão cheio de arestas: uma aprendizagem necessária, dura e eterna.

(Desejo alguém com todo seu pavor e chego até a querer engoli-lo para digerir a mim mesma.)

(Sou bem esquisita. Segundos atrás havia vontade de sair e dançar. De repente me acometeu uma preguiça de demonstrar que a vida é alegre. Vou dormir abraçada na solidão.)



Uma cor que me convém

Bermudas brancas, tenho três.
Uma delas é marfim, mas o conceito é o mesmo, mais adiante eu explico.
A primeira tem bolsos do lado, por isso uso para caminhar, uma vez que tenho que levar chave do carro, protetor solar, identidade e um din-din para a água de coco.
A segunda é bem antiga, herdada da minha irmã, mas parece nova. Uso muito no pós-praia, porque bate no meio da coxa. Normalmente com camisetinha colorida, biju e chinelo. A combinação perfeita é com uma camiseta rosa bem “cheguei”, de malha canelada, e um conjunto de colar e brinco vindo de São Luis. Colar de flores amarelas, de crochê. Eu fico um vibrante jardim!
E por fim há uma mais comportada, que chega quase no joelho. Faz o estilo mais casual e fica muito legal com azul, tipo look iate clube.
Já ia me esquecendo: tenho um shortinho branco de linho, que se fixa na cintura por uma corda amarrando. Este é o mais curto de todos. Quando uso, tô abusando!
Agora voltando ao conceito: uso branco na parte de baixo para realçar as cores da parte de cima. Acho que branco cumpre mais esta função que o preto e, no meu caso, dada a proporção do esqueleto, fica bem mais equilibrado.
Calças brancas, tenho quatro: duas de trabalho e duas mais despojadas – uma delas de brim e a outra de tecido mais fino, com stretch, e preciso usar meia calça por baixo para não encabular.
Tenho saia branca também, uma só. E um vestido que desce justinho até a cintura e depois vai abrindo. Estende-se até a curva entre a coxa e a batata da perna. Este é bem praia, bem verão, e usei no último reveillon.
Já ia me esquecendo, até porque nunca usei, da mais recente aquisição de vestimenta desta cor: um outro vestido. Lindo! Super “chique”, embora natural, com um tecido que lembra renda, com paetês furta-cor bordados ao longo, dispostos aleatoriamente. Seu decote faz um lindo colo, valoriza a saboneteira com uma alcinha bem fina e geometricamente distribuída na forma oval.
E as calcinhas, são quase todas brancas. Facilita diante de tudo que descrevi acima, mas até para amar prefiro esta cor. Tenho muitas de algodão, sem costura, para não marcar. Várias da marca Liz. As de renda, eu adoro: marcam presença na hora do amor.
As blusas brancas são incontáveis, de todos os estilos e jeitos de me vestir.
O branco para mim lembra o novo, a estréia, a possibilidade...
Eu acho muito charmoso e tem muita personalidade!

sábado, 18 de abril de 2009

O meu amanhã chegou

Há tempos no peito os signos: os anjos me preparavam. Mas só na ressaca da morte é que há a confusão. O que eu vejo? Uma nova ordem, uma permissão, uma passagem muito estreita para uma futura amplidão. O pé sangrando e as lágrimas, o corpo jorrando água, a alma buscando uma paz.
Uma ciranda de cura se dá. Algumas magias e forças rasgadas de seios doando de si. Me falta ainda muita razão e o ar para respirar. Várias imagens, muitas mensagens, algum conforto. Um caminho será preciso e uma mão pra me amparar.
O Homem vibra diante do fato: não tem jeito, não tem ato, e eu resisto por me entregar. Quanta culpa pra me livrar, quanta dor por medo de errar... Me abrigo nos colos e vivo uma loucura cercada de amor. O agudo se faz tão grande que é preciso lavar a louça, arrumar a casa e correr ao mar pros braços da mãe. Saio simples de manhã, vejo as marcas no coração, e as pegadas que sei que irei dar.
Num mundo rondado por máscaras é longe o lugar da razão. Amar não é um luxo, mas a condição mais simples que há. Cuidar não é um espanto ou um tormento - e eu aceito. Carrego no fundo do peito um orgulho do meu valor. Temo o dia de amanhã feito quase não crer na guinada. Olho a cria, sinto minha força acuada e busco por meio de sonhos alguma direção nessa estrada.
Vejo o momento adiante com alguma compreensão. Eu prometo: recebo a vida e a minha condição. Mais uma noite à frente com suas energias e bênçãos. Tudo claro, dia raro: o meu amanhã chegou.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Primeira impressão

Amei o teu corpo no meu
O beijo na sacada
A minha alma encontrada
Amei teu olhar chegando perto
Passeando pela minha fala
De encantar multidões
Amei o avesso do início
O refletido
O sentido parido
(o pré-sentido)
E o trajeto escolhido
Amei o conceito
O não entendido
E o meu defeito que nos uniu: humanos e naturais
Amei, então, o concedido.
Amo o desejo de reencontro
Teu comigo
Meu comigo
E de todas as lembranças com suas possibilidades
Amo o tempo e suas verdades
O caminho a ser traçado
E coragem de viver.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Ressaca

Tem momentos de mim que só são permitidos para algumas pessoas
Possuem acessos cujo critério pouco-a-pouco reconheço
São lugares de voz fraca
Força fraca
Olhar cheio, a transbordar.
Eu diria que são momentos coração
Onde a sociabilidade pouco importa
O ridículo descortina-se majestosamente
Fazendo a humana essência crescer
Aparecer
E vencer.
(nem que seja à tapa!)

Aos amantes da solidão

Na maioria das vezes eu não sei. É um vasto que me habita bem no centro, justo na referência. Eu puxo o fio e o novelo é longo. Nesse desenrolar é que brotam as palavras. É feito ilha onde elas nascem, com margem de praia longe. Eu fico sentada numa pedra molhando os pés no mar. A vida passa e eu mergulho, sem nem saber nadar. Se me bate o desespero, uma verdade me salva: somos todos sozinhos – duas pernas, dois braços, mãos e pés cheios de dedos e um pensamento sem fim. Esta é a minha imensidão: um pensamento sem fim – e desejo a solidão a modo de ter medo de nem desejo mais ter. Até que algo me dói, o corpo dá sinal, por via de uma lágrima ou de falta de sexo. O caminho faz volta e as mentiras que eu conto me fazer rir. Ainda hoje contei que adormecera antes do tempo, só pra me proteger. Eu invento, casulo, esquento, me estico... e só depois eu volto a pertencer.

Diário em oração (Por mim, por Clarice e Chris & Dom)

Acordei nua: pele e útero. O dia foi perdendo a densidade e não fora possível vestir-me depois de ter bebido até ficar idiota. Cantei alto, uivei no corpo e, graças a Deus me protegi te terem me penetrado sem preparo. Depois de conhecer Lóri e Ulisses e me compreender no absurdo anteparo (da vida), o que quero é dor sem razão: só profunda, só nos poros. Dor de chão e de choro, até esvaziar. Já vi gente que encara o ciclo da morte de frente, mas pintando para vivê-la ainda maior, sobrepondo qualquer possibilidade de humilhação com coragem de abismo... por essa me acometi. Se um dia eu me unir a Deus, por modo de saber quem sou, eu me autorizo a viver um sexo que nunca soube: para sorrir de alegria funda e fraquejar de amor delicado. Eu me rendo, eu me rendo... Repito mil vezes pra conseguir, tentando perder a cólera no caminho de me aceitar. A minha loucura não passa. Às vezes me cega de ver o miúdo da vida, mas mesmo assim, dou graça. Tenho medo de ficar normal, parar de sonhar estranho e não perceber a ligação entre o mundo e eu. Ainda bem que sou mãe: tenho função e o meu umbigo com a santidade. Amém.

O peito às voltas e um coração que não descansa pela floresta da madrugada

“Só a alma atormentada pode trazer para a voz o formato de pássaro”
Manuel de Barros

O peito às voltas e um coração que não descansa pela floresta da madrugada. Desejo uma queda de 25 metros para a vida sorrir pra mim: uma queda em água seguida de cachoeira e meu corpo passear sem esforço. Sou vasta de palavras que buscam preencher o espaço entre minha fantasia e eu. Existem fatos: sorrio mais do que a maioria - ser alegre é uma referência. Vivo a pele, o peso e o líquido com intensidade. Gosto de sexo pela manhã, de noite e de tarde, sendo capaz de passar horas nesta ocupação (me enrosco no corpo do outro e desfruto do seu universo e do meu – amplidão). Adoro conhecer o mundo mas me apego demais ao meu leito e, mesmo sem leite, continuo amamentando, então quase não saio daqui. Tenho medo, choro verdadeiramente com dificuldade e não sei o que pode acontecer se estabeleço limites.
Vim à vida para a maternidade e tenho a ilusão de que tudo nela segue o processo de concepção, geração, parto, desenvolvimento, maturidade e morte. Tive várias mortes que não controlei, algumas delas por suicídio. Nasci algumas vezes por querer e cresci de forma natural ou forçada, outras vezes sequer percebi e já estava com desenvoltura e espanto. Tenho vontade de que a noite seja um útero de me refazer, o que poucas vezes atinjo. Há mentiras que me servem, caem bem no meu repertório de sobreviver dentre as verdades que descarto. Há verdades que eu adoro e me apego. Ambas (mentiras e verdades) compõem um eixo de eu navegar e me sustentam num caos em equilíbrio sem concentração. Quando a escrita me acontece nada interrompe, nem o que há por fazer: é uma ordem.
Sinto-me sozinha demais: por dificuldade de saber quem eu sou, quem são os outros, e que podemos conviver sem sermos uns os outros - isto é só uma hipótese que há tempos investigo, ainda sem conclusão. Nas horas em que divago: procuro mensagens no celular, leio textos na Internet, vejo fotos de momentos que de amar, tudo muito rápido e sem profundidade. Temo fortemente a hora de ver grande e de perto, vôo alto ou passo rente às trevas, me queimando só na superfície... e eu odeio a superfície porque ela não me satisfaz.
Me visto colorida e na moda, como desordenadamente, durmo mal se estou ansiosa, falo de forma descompensada e vou na paralela. Sonho com freqüência e me lembro: uma dádiva. Não avisto o ponto de chegada, e É CHEGADA A HORA, eu sinto! Eu sinto e vejo, tudo em volta me diz. Que diabos será quem eu sou? Que anjo me dará a mão? Este ano até na igreja fui e orei, mesmo sem fé. Invejo a crença alheia e só confio na poesia: só nela e nem em mim. Estou com vontade de parar a vida e desfrutar de um ócio profundo e terno: virar caramujo, hibernar e, então, feito caule, crescer pro futuro numa diferente tonalidade. Eu quero ser um sol e amanhecer bem de tarde, só depois de espreguiçar. Desejo preocupar só com as coisas que valem à pena. Mas o que vale à pena? Qual a essência? Repito a pergunta com a um mantra, no sentido de decifrar. Eu penso que só respondo se relaxar, eu penso sem relaxar, eu penso e não respondo, eu penso só, eu penso, penso.. e o peito às voltas, um coração que não descansa pela floresta da madrugada onde me acho nitidamente acordada, a procurar o amor.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Eu quero viver exatamente o agora e tecer o amanhã com fios de amor

“A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E a outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e rindo
E gozando do nosso segredo comum
Que é o de saber por toda parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena. “
Alberto Caeiro / Fernando Pessoa

Enquanto não há o que dizer de tanto sentir, conto que muito aprendi. Respeito a hora matutina, ainda escuro, quando não avisto o ponto de chegada. Carrego no ventre uma humanidade inteira: engravidei de visões e não posso abandonar os filhos na travessia – este Homem haverá de mudar e este mundo será outro. Perdi os contornos, desmancho sem controlar, justo eu que careço de limites. Benditas as palavras que me cercam, se não eu ia evaporar...
Eu quero viver exatamente o agora e tecer o amanhã com fios de amor. Me achei de ser tecelã de uma teia forte e fluida. Aprumei de incluir na batalha cada lágrima, toda angústia das coisas inomináveis e os apertos no coração. Os sorrisos são meus guias pelo gosto da essência que tem – de criança. Eu concentro, olho dentro: tanta coisa! Carrego em mim toda confusão de um fato perto da morte: um filme que passa, sem início e sem final, mas pleno de sentidos para um aprendizado súbito.
Com as pessoas que costurei e emprestei meu estampado, com aquelas que cozinhei e alimentei o meu trajeto, está no peito alguma marca, uma lembrança, uma força de continuar a entregar todo meu tesouro a cada instante. Descobri que a presença é um presente raro que eu sei dar - depois de muito me esquivar entendi, e por isso sou capaz de passar horas a fio a conhecer universos e sabendo de mim.
Desejo uma gente que se reconhece por apenas olhar: nenhuma palavra traduz seu valor a não ser a palavra amor, que não se pode reduzir.
Cada poema: uma flor nascida inesperadamente num seio de pedras. Um milagre que não se entende e se confia como amuleto. Um poema com palavras, sem palavras, feito abraços, leitos ou lares de abrigar os sonhos altos. Eu quero sonhar sonhos altos pra voar em balões.
É hoje o dia, é esta a hora, o que é preciso está dentro: os encontros são de minha responsabilidade e fruto da minha coragem pra ir além dos alicerces. O meu coração pulsa e posso sentir a curva de transmutar logo adiante em mim. É triste o instante de respirar, mas há esperança por unir-me ao Deus criança que passeia naquela aldeia por onde Caeiro andou. De tudo que existe, as coisas concretas de me apegar são: meu filho me chamando pra brincar, mate gelado na geladeira, chorinho na praça e tapioca, desejo de viagem e alguma fome. De tudo que insiste em ser relevante, só uma coisa importa: viver exatamente o agora e tecer o amanhã com fios de amor.